Muitas crianças chegam às artes marciais porque seus pais receberam de alguém a recomendação de nelas colocar seus filhos para que aprendam disciplina e concentração. As artes marciais tem a fama de desenvolver concentração e disciplina, mas qualquer atividade física, dança, esporte pode fazer isso. E não há necessidade de ser atividade física, pode ser música, pintura, arte em geral. Mas porque são as artes marciais que carregam esse status?
Para responder esta pergunta é preciso pensar sobre qual tipo de disciplina estamos falando, ou melhor, qual disciplina está sendo oferecida para então questioná-la e propor algo melhor do que o que está sendo feito nas aulas de artes marciais. Mas antes, vamos falar um pouco sobre a natureza da criança.
A criança é naturalmente dispersa, pois seu tempo de atenção dura muito pouco, a não ser quando ela encontra algo que lhe interessa, então ela não quer parar com aquilo, seja lá o que for. Por esse motivo pais procuram um meio de disciplinar os seus filhos, fazer com que eles os ouçam e obedeçam.
Normalmente o tipo de disciplina oferecida em escolas de artes marciais é tipicamente militar: crianças em fila, em formação organizada obedecendo comandos de voz, contagens e repetindo movimentos estereotipados que não lhes faz sentido. Estereotipados por serem movimentos copiados de um modelo externo, que é o(a) professor(a), ao invés de um movimento construído pouco a pouco com base no próprio corpo e sem sentido kung_fu_pandapor estes movimentos serem executados desprovidos de um contexto, de maneira que a criança não enxerga para que serve o movimento, como se utiliza.
Professores de crianças devem entender sua natureza e utilizá-la a seu favor ao invés de suprimi-la, que é o resultado de métodos de ensino como este que acaba de ser descrito. Crianças possuem muita energia e precisam gastá-la e o que as escolas de artes marciais geralmente entendem por disciplina e concentração significa controlar e impedir a expressão desta energia, o que gera tensão e pode ter consequências sérias para sua saúde e desenvolvimento físico, mental e emocional.
É por conta desta abundância de energia que elas são naturalmente dispersas e não ficam paradas. Dessa forma, se a aula não estiver atrativa o suficiente elas vão procurar algo mais interessante para fazer, o que faz com que os professores respondam com broncas, usando da autoridade concedida pelos pais no ato da matrícula e do pagamento da mensalidade. Só dessa maneira o professor consegue colocar a criança quieta no lugar ou sentada esperando a sua vez. É claro que a criança aprende, pois é uma questão de treino, constituído de berros dados pelos professores e o resultado é uma criança “disciplinada” por medo da autoridade e obediência cega, disfarçada de respeito à hierarquia, ao invés de disciplinada conscientemente.
Numa aula de artes marciais ou educação física é indesejável que a criança fique sentada esperando a sua vez. Então enquanto estiver esperando ela precisa de algo interessante e produtivo para se manter ocupada, em movimento e que seja relacionado às artes marciais. Portanto, professores e pais devem entender que não é natural da criança ficar em silêncio a maior parte do tempo em uma aula de atividades físicas, assim como não adianta também fila e formação, já que o normal da criança não é a “ordem” e sim a “desordem”. Obrigar a criança a ficar “em ordem” numa formação é transformá-la num robô treinado para obedecer comandos, pois plantada em um lugar onde alguém a colocou ela não desenvolve inteligência espacial, pois a formação não é um estímulo para que ela desenvolva esse tipo de organização, mas simplesmente uma cópia e obediência a uma ordem recebida.
Disciplinar não é isso, não é matar a espontaneidade da criança, mas sim conduzi-la por um caminho que lhe estimule a autonomia e a criatividade para que aprenda a tomar decisões inteligentes e responsáveis. Para isso, ao invés de controlar os movimentos e ações das crianças mantendo-as no lugar obedecendo contagens e repetindo movimentos em conjunto, professores responsáveis de artes marciais devem trazer atividades que prendam a atenção das crianças mantendo-as entretidas e ansiosas em ouvir o que ele ou ela tem a dizer, pela próxima atividade e até mesmo livres para propor outra atividade ou decidir continuar com a mesma se for mais interessante.

Em resumo, uma aula de arte marcial infantil é barulho, é risada e desordem. Mas apenas um especialista em arte marcial infantil é capaz de fazer isso com habilidade, atingindo ao mesmo tempo os interesses das crianças, os objetivos propostos pelo próprio professor e os resultados almejados pelos pais sem transformar a aula em mera brincadeira sem sentido e sem perder as características das artes marciais. Nenhum pai deseja ter seus filhos transformados em robôs obedientes e alienados, mas sim crianças com consciência e autonomia, por isso, é uma decisão responsável procurar um professor especializado no ensino de artes marciais para crianças.

Professor Jerônimo Marana

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