Muito se diz sobre a diferença entre artes marciais, qual é melhor e qual é pior, o que funciona e o que não funciona. Isso tudo pode ser muito relativo, dependendo do ponto de vista. O que é melhor para um pode não ser melhor para outro, isso tem a ver com o gosto pessoal e com a afinidade do praticante por determinado professor ou método de ensino. Assim, um professor com conhecimento superficial não serve para alguém que quer aprender algo mais profundo, a não ser no nível iniciante. Por outro lado existem pessoas que não querem tanto comprometimento, de conhecer a arte marcial de maneira mais detalhada, profunda, preferindo algo mais fácil e que exige menos concentração, assim essa pessoa não irá se adaptar a métodos, professores ou artes marciais mais meticulosas e sofisticadas.

Da mesma maneira, o que funciona e o que não funciona também é relativo. Funciona contra quem? Não funciona contra quem? Por pior que seja uma técnica, se ela consegue resolver o problema a que se propõe numa determinada situação ela funciona funciona. Se numa situação de defesa pessoal o indivíduo conseguir se safar com uma técnica ruim, então aquela técnica funciona. Talvez não funcione contra um adversário mais experiente, talvez funcione. Em termos de funcionalidade até não saber nada funciona e mesmo um artista marcial de alto nível pode ser vencido por alguém que não sabe nada, pois vários fatores interferem na probabilidade de sucesso ou fracasso e o conhecimento em arte marcial é apenas um deles. Além do mais, artes marciais não tornam ninguém invencível, ninguém escapa de bala porque sabe arte marcial.

Então comparar o que funciona e o que não funciona, ruim ou bom, melhor ou pior está fora de questão neste ponto de vista. Mas num determinado ponto de vista podemos falar em certo e errado e dentro disso às vezes podemos falar em melhor ou pior, outras vezes podemos falar em diferenças. Para explicar darei um exemplo. Imagine dois times de futebol que jogam de maneiras completamente diferentes, como Real Madrid e Barcelona (mesmo sabendo que muitos artistas marciais não se dão muito bem com bolas, acredito que dê para entender). O futebol que as equipes jogam é o mesmo, mas as estratégias são diferentes. Ambos estão corretos e o que é melhor ou pior depende da situação, às vezes uma estratégia funciona num dia e não no outro. Nada funciona sempre, não é à toa que na história das artes marciais tantos impérios e governos foram derrubados por outros. Caso contrário, talvez o império mongol existisse até hoje.

Porém em termos de biomecânica existe o certo e errado. Muitas são as possibilidades de movimento certo e errado, mas mesmo movimentos mecanicamente errados podem funcionar em situação de defesa pessoal, por exemplo. Um método pode ser considerado correto quando leva ao fim desejado, senão é errado. Também podemos falar em certo e errado levando em conta o aspecto da saúde: normalmente, quando se treina de maneira errada as lesões aparecem, só que por diferenças individuais, alguma pré-disposição, alguma experiência anterior ou até por acidente uma pessoa pode se lesionar ainda que esteja treinando da maneira correta. Porém existe um processo para se atingir o que é correto que passa pelo erro. Então existe muita relatividade em tudo isso.

Pensando assim podemos pensar na comparação entre artes marciais. Existem métodos de treinos melhores e métodos de treino piores. Existem muitas maneiras corretas e muitas maneiras erradas de treinar. Dentre as maneiras corretas algumas são melhores do que outras. Assim se faz importante conhecer outras artes marciais. Pessoas diferentes, com pensamentos e culturas diferentes, vivendo em lugares diferentes deram origem a métodos distintos de treinamento, assim muitas vezes as artes marciais se diferem umas das outras apenas no método de treino, de forma que uns sistemas tradicionais de treino possam ser melhores do que outros, ou melhores num ponto e piores em outro. Pode acontecer de uma arte marcial ter uma teoria mais bem elaborada e uma prática mais refinada do que outra. Não significa que aquela menos refinada esteja errada, mas apenas que com alguns ajustes ela pode melhorar. E essa melhora pode vir olhando para as outras artes marciais. Claro que existe o fator do professor também: uma arte marcial pode ter um ótimo sistema e um professor ruim, ou um sistema ruim e um bom professor que faz algumas adaptações e transforma aquilo em algo melhor.

Muitas vezes praticantes criam preconceito contra outras artes marciais simplesmente por não conhecerem a sua prática, os seus por quês, então ao ver que praticantes de outras artes marciais treinam de maneira diferente da sua julgam que aquilo é ruim, que não funciona, que é encenação,que é errado, etc. Às vezes pode ser verdade, mas muitas vezes isso é puro desconhecimento do por quê se treina de tal forma. Tudo tem um motivo, uma justificativa. Pode até ser que a justificativa não seja plausível, mas antes de tirar conclusões é preciso conhece-la. Às vezes não conseguimos compreender muito bem algum aspecto da nossa arte marcial e é justamente na explicação do outro que encontramos a resposta. Não significa necessariamente que a sua arte marcial esteja errada porque você não entendeu alguma coisa, talvez a maneira que ela enxerga aquele ponto lhe seja um pouco mais difícil de entender ou que de repente algum conhecimento se perdeu com o passar dos tempos, o que é algo que tem mais a ver com o indivíduo do que com a arte em si. Supondo que algum conhecimento na minha arte marcial tenha se perdido e se tornado obscuro eu posso olhar para o mesmo aspecto em outra arte marcial, aprender com aquilo e recuperar pelo menos parte do que foi perdido na minha. Eu mesmo aprendi muito sobre kung fu treinando hapkido e vice-versa. Também aprendi muito sobre as artes que eu treino fazendo uma aula ou estudando a teoria de outras que eu não pratico. E também perdi muito preconceito, vendo que as artes marciais em si não são exatamente diferentes umas das outras, apenas que alguns métodos de treino são melhores, outras vezes são simplesmente diferentes, caminhos diferentes que levam ao mesmo fim. Algumas artes marciais conseguiram se desenvolver mais do que outras por algum fator cultural ou histórico enquanto outras se tornaram mais superficiais, mas de maneira geral são todas muito semelhantes.

Um outro ponto importante de ser observado é que as artes marciais não se desenvolveram isoladas umas das outras. Toda forma de autodefesa criada pelo ser humano possui relação com as outras, já que cada sistema foi criado e aperfeiçoado com o objetivo de vencer outros sistemas existentes. Assim se aprende melhor um sistema quando este for estudado em relação a outros do que isoladamente.

Claro que nem tudo é de boa qualidade, algumas teorias podem ser muito falhas e não é preciso concordar com tudo, mas é preciso conhecer primeiro para depois concordar ou discordar. É preciso também conhecer os outros estilos e questionar o nosso próprio, para então tirar nossa conclusão do que é melhor ou pior, lembrando que isso leva em conta o indivíduo (melhor para quem e pior para quem?). É importante conhecer outras artes marciais e comparar com a nossa, pois comparar de certa forma é fazer ciência e a ciência descarta o que não serve para buscar a evolução.

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